Dividir o fone ou andar sozinho?
Talvez seja meu organismo que atualmente me faz levantar cedo por motivos estranhamente bons. Meu braço direito vai quase que automaticamente pegar a cotidiana jarra cinza que uso para ferver a agua do café. Três, quatro, cinco colheres de pó e alguns minutos de fervura. O prazer inigualável da cafeína misturado ao aroma sedutor fazem da minha manhã ainda mais pensativa. Uma xícara, um pão. Ninguém pra perguntar se quero mais ou menos manteiga no pão, ninguém pra reclamar da falta de açucar no café, ninguém além do meu subconsciente sempre tentando me animar. "Ahh, mas ela gosta das suas músicas" - disse ele, todo esperançoso "É, pelo menos isso, eu acho" - respondo a mim mesmo, confirmando com a cabeça e concluindo que realmente estou enlouquecendo ao conversar comigo mesmo as 7:17 da manhã.
Desço dezoito degraus e estou fora de casa. Observo o trânsito que se forma diariamente na minha rua e suponho que estas pessoas dentro destes carros não pareçam estar felizes também. Olheiras grandes e olhares fixos nos 3 centímetros de avanço entre um carro e o outro fazem com que eu tenha a certeza.
Sigo em direção a pista de corrida, o que nada mais é do que uma pequena parte da avenida principal pintada de vermelho. Alongo, aqueço e inicio uma playlist de Jazz suave no mesmo instante em que inicio meu exercicio matinal. Provavelmente sejam as notas dissonantes que fazem com que eu não queira parar de andar ou até estas fórmulas de compasso sempre tortas, tal como meus passos.
Passos curtos e levemente rápidos. Alcanço a marca dos quinhentos metros e diminuo o ritmo para observar um casal. Ele, longe de ser o próximo galã da novela. Ela, provavelmente não se classificaria para o próximo Miss (padrão rede globo de beleza) Brasil.Talvez se eu não fosse o ser tão emocional que sou, pensaria: "Nossa, que perda de tempo. Qual a vantagem de sair pra caminhar dividindo um par de fones de ouvido? Você perde boa parte dos arranjos da música e ainda tem que andar lentamente para o fone não cair, fora o desconforto de andar sempre no mesmo ritmo da pessoa do lado" E então, meu ser emocional que sou responde: "Quando você caminha sozinho provavelmente você chegará mais rápido, porém quando você caminha acompanhado. Você nunca está sozinho"